Carta de Lyon

Das Minas Gerais para Lyon e de Lyon para todos que gostam de compartilhar experiências. Navegar é preciso, viver não é preciso! Vinhos, gastronomia, culinária, costumes, hábitos, paisagens. Liberté, Égalité. Fraternité. Libertas quae sera tamen. Uma mistura a rechear estas Cartas de Lyon.

25.9.04

Passeando por Lyon

Como hoje é sábado, é dia de passeio, então vamos a ele:

Hoje, logo que acordei, já percebi que o tempo estava frio, daquele jeito que eu gosto. Já exige blusa de lã e casaco e fiquei imaginando o que vai ser quando chegar o inverno mesmo. Por causa do frio, quase desisti do meu propósito de sair de casa pela primeira vez de ônibus, essa história de ficar só andando de metrô, debaixo da terra, não ajuda a conhecer a cidade e a vê-la por outros ângulos. Mas apesar do vento cortante na esquina, fui de buzun mesmo.
Desci em uma das maiores estações daqui – Gare Perache - que concentra tudo (ônibus, metrô e trem, inclusive TGV), enorme. Mas logo que saí, o encanto... é uma belezura esse trecho da cidade que está entre a praça Perache e Bellocur. É a parte mais clássica e fiquei encantada com as ruas e construções. São fachadas lindas, com sacadas e janelas de babar. Ao mesmo tempo, tem algo de suntuoso e bucólico. E as construções não passam de 6 andares o que acaba dando uma harmonia linda de quarteirão a quarteirão. A rua principal é destinada só para pedestre e é cheia de gente de todas as idades e jeitos, caminhando pra lá e pra cá, e eu fui caminhando junto, sem pressa , admirada... E a cada esquina, outra visão, outro conjunto convidando a explorar. E de tempo em tempo uma praça pra parar um pouquinho, descansar, botar reparo. A minha alma enche de andar por lugares assim...
Tinha a intenção de ir a pelo menos um museu ainda pela manhã, mas uma coisa ruim aqui, é que as informações sobre aos horários de abertura, nem sempre corresponde. Vou desistir de ir a qualquer museu pela manhã, porque já quebrei a cara algumas vezes. Realmente o francês não é mesmo de coisas cedo. Mesmo eu, que também nunca fui muito da manhã, já estou entrando no ritmo. Mesmo indo dormir antes das onze, não levanto antes das nove. Também acho que é porque clareia mais tarde e também tem o frio...
Mas um dos museus que com certeza vou voltar, em homenagem ao meu querido irmão, é o museu dos hospitais e da medicina. Fica dentro de um hospital enorme, que funciona até hoje, e sabem de quando que é a construção? Beirando 1500. Sabem quem foi médico lá? Rabelais, e dizem que lá escreveu seu livro mais famoso – Pantagruel. Mas enquanto não sabia que ele estava fechado, fui andando pelo hospital e o que já vi, é fantástico. São corredores enormes em estrutura gótica, abertos para pátios. Aí, a imaginação voa mesmo. Fiquei imaginando que pessoas em 1500 , andaram ali, trabalharam ali, e que medicina deveria ser feita, meu Deus?
Bom, andei mais um pouco pelas ruas lindas e depois resolvi procurar um restaurante. Minha intenção era achar uma tal de Rua Mercière, que pelo que eu tinha lido e ouvido falar, concentrava uma boa quantidade de buchons maravilhosos. Custei a achar, mas como alguns já sabem, não vejo problema nenhum em me perder aqui, é apenas mais uma maneira de descobrir cantos inesperados.
Mas acabei chegando, e olha, que lugar... é um restaurante ao lado do outro, cada um mais lindo, em uma rua fechada, cada um com seus enfeites, suas mesas sua decoração, mas tudo conjugando pr’um clima delicioso! E os cheiros então...
Tinha separado da minha listinha, dois nomes de restaurante nessa rua, mas, pelos preços, vou deixá-los pra quando receber minha bolsa. Nada de extravagâncias... ainda, por enquanto.
Escolhi um restaurante lindo, de preço mais razoável e aí começam os riscos gastronômicos que adoro correr e que, por enquanto, só tem me trazido belas surpresas. Vamos ao menu. Começando por uma salada et chévre chaud – traduzindo, com queijo de cabra quente, ou derretido. E além do queijo em creme, por cima da salada, ainda vem duas boas torradas, com pedaços generosos de queijo assado por cima. Ai que delícia, que combinação maravilhosa. Pois é, uma maravilha. Depois, uma espécie de lingüiça (aqui o povo é chegadinho em embutidos) com molho de mostarda. Ai, ai, ai, ô trem bom. Eu adoro esses sabores! Acho até que daqui um tempo vou estar sentindo a maior falta de uma comidinha mais trivial, mas por enquanto, estou amando o que como. E pra fechar: tarte au chocolat, com creme. Aí foi chave de ouro, de comer ajoelhada, uma benção. Saí literalmente satisfeita, e nos dois sentidos, pela tampa, e feliz da vida com os sabores que degustei.
Aí fui andar mais um pouco, mas estava em uma parte mais chic da cidade. Parei em vitrines Pierre Cardin, Lacroix, Vuitton e aí a gente vê que tem gente rica nesse mundo mesmo. Tem cada loja maravilhosa que me deixa doidinha só do que vejo na vitrine; coisas para casa, decoração, móveis, antiguidades, canetas, acessórios para vinho, brinquedos então... fico babando.
Aí, cheguei ao museu do tecido e artes decorativas. Já comentei que aqui é a origem e o centro da produção da seda francesa, e fui nesse museu até com pouca expectativa, mas acabei surpreendida... olha, fiquei encantada. Os teares são maravilhosos, os tecidos, as roupas. Tem tecidos que são verdadeiras obras de arte. Vai desde a roupa dos reis, da corte, dos tecidos que revestiam os quartos, as camas sei lá de qual século até a alta-costura francesa de hoje. E passa por outros países – oriente, China, roupas de papas. É uma maravilha! Ainda mais do jeito que os museus aqui expõe as coisas; iluminação, ambiente, explicação, uma beleza! Já a parte de arte decorativa, achei menos interessante, mais de um período só, do que costumamos chamar aí no Brasil de estilo Luiz XIV.
Saí de lá encantada, andei mais um pouquinho, parei em uma praça para ouvir uma música de um grupo de instrumentos de sopro e depois vim embora, cansada com tanta andança. O dia foi bom demais!
Algumas curiosidades: aqui tem sacolinha pra transportar cachorro e ela é chic, acolchoada, bota-se o cachorro dentro, fecha-se com zípper, deixando a cabeça para fora, é claro, e aí você pode levá-la como uma bolsa, ou uma mochila. Pelo que percebi é para evitar calçadas cheias e poder levar seu au-au para a praça ou o parque. É também muito interessante ver um tanto de cachorro amarrado na porta do super-mercado, esperando ansioso seu dono sair lá de dentro. Outra curiosidade é o protetor frontal para carrinhos de neném em tempo de frio. Para o neném não ficar exposto a ventos, tem uma espécie de capa transparente para a parte aberta. Talvez alguém já tenha visto essas coisas no Brasil ou em outros lugares, mas eu tô vendo pela primeira vez.
Amanhã farei o roteiro de domingo. Depois conto,
Beijos,
Kátia