Carta de Lyon

Das Minas Gerais para Lyon e de Lyon para todos que gostam de compartilhar experiências. Navegar é preciso, viver não é preciso! Vinhos, gastronomia, culinária, costumes, hábitos, paisagens. Liberté, Égalité. Fraternité. Libertas quae sera tamen. Uma mistura a rechear estas Cartas de Lyon.

10.11.04

Meu encontro com Baco

07/11/2004


Vou começar meu encontro com Baco pelos passeios da semana passada. Aconteceu, aqui em Lyon, em um local bem próximo de onde estou – Halle Tony Garnier – o salão dos produtores independentes de vinho de toda a França. Trata-se de um grande local de exposição, onde estavam reunidos mais de 500 produtores das mais variadas regiões. Pelo módico preço de 3 euros, ganhava-se a taça de degustação e o direito de degustar o que bem quisesse ou conseguisse. Vocês podem imaginar como gostei! Tanto, que fui por dois dias seguidos. Provei os rose da Provence, os brancos da Alsace, as legítimas e maravilhosas champagnes de Champagne, os fantásticos Sauternes e seu maravilhoso sabor levemente defumado, e os excelentes, já tradicionais, Bourdeaux e Bourgogne. Me deliciei! Essa feira é uma completa perdição! Comprei alguns, já deixando os especiais guardados para aqueles que vem me visitar, e lembrei-me muito dos meus amigos da CONVIVA (Confraria dos Amigos do Vinho do Vale do Arrudas). Ah, a gente junto aqui!
Depois, nesse final de semana, uma outra maravilha; a exposição “Le vin: Nectar des Dieux, Genie des Hommes”, no museu Gallo-Romano de Fourviere. Realmente me emocionei quando entrei na exposição, encantada com a sua beleza e, de novo, com a lembrança dos amigos. A exposição reúne objetos de vários museus, contando a história do vinho: sua produção, seus utensílios, seus mitos, suas cerimônias, os ritos e sacrifícios que o envolviam. Coisas de 2000 anos antes de Cristo, suas histórias pelo Egito, Grécia, Roma, até chegar à Gália (região, é claro, de Lyon).
Lá estava Dionísio, lá estava Baco e seu cortejo com as Bacantes, ensinando sobre o prazer, a alegria, sobre os sentidos, e também sobre a temperança e a medida. Conheci as crateras, locais onde se misturavam a água e o vinho. Uma linda, enorme, em bronze, que comportava até 1.200 litros de vinho, enfeitada com altos relevos do cortejo das bacantes, e tendo como alça, duas figuras femininas, em posição nada conservadora, simbolizando a fertilidade, e a dádiva da terra.
Conheci os locais onde, de modo ritual, o que seria o primeiro gole, era lançado a terra, em sinal de fertilização, mas também como uma forma de umedecer os subterrâneos e ajudar a ascensão dos mortos e dos deuses ao Olimpo. (origem provável do nosso “gole pro santo”).
Aprendi que Symposium, eram grandes banquetes, onde as pessoas se reuniam para celebrar algo.
Cada objeto, mais bonito e mais significativo que o outro, contando a história do sentido transcendente do vinho, que em sua associação sagrada ao sangue, era usado em rituais de sacrifício, representando ao mesmo tempo vida e morte. Atravessa os tempos, e chega até nós no sacramento cristão da eucaristia.
O clima da exposição é fantástico! Dezenas de âmphoras, algumas datadas do séc. 3 antes de Cristo, já com a marca do produtor e do comprador.
Claro que cheguei em casa, estou escrevendo e tomando uma taça de um ótimo Bourdeaux.
Salut!
Um brinde aos gostos e à vida!